Por que realizar uma orientação parental de adolescentes?
- psicottrauma
- 23 de mai. de 2024
- 5 min de leitura

Para muitos pais e mães, a adolescência não traz impactos significativos à convivência. A vida segue seu fluxo, trazendo as mudanças previstas, mas de uma maneira agradável, leve, sem grandes conflitos. Para outros, ter filhos adolescentes pode ser um momento desafiador, uma avalanche de preocupações e dificuldades.
Não existe apenas uma adolescência; existem várias. Este período de vida, que geralmente compreende entre 10 e 19 anos, segundo a Organização Mundial de Saúde, pode sofrer influências do status socioeconômico, da cultura (sobre os padrões comportamentais que são aprovados e reprovados), da família, dos pares de convivência, da escola. Essa consideração requer, portanto, um conhecimento regional especializado sobre o modo de viver, das preocupações vivenciadas pelo adolescente, a identificação de seus recursos, bem como a identificação de suas principais dificuldades. Digo isso porque é fácil cair em um estereótipo em que a adolescência traz em si uma carga negativa; basta ser adolescente para ser sinônimo de problemas comportamentais, rebeldia e intensos conflitos. Não é bem assim.
Alguns adolescentes podem viver de uma forma tranquila, sem grandes oscilações de humor, com contextos saudáveis de interação. Possuem amigos, estudam ou trabalham, tiram notas escolares satisfatórias, relacionam-se bem com sua família, relatam sentir-se bem consigo mesmos, vivenciam uma sexualidade sem grandes conflitos, têm apreciação pela vida e sensação de bem-estar, vivem com responsabilidades. Não estão isentos de sofrer, mas contornam bem as situações e lidam com suas emoções saudavelmente.
No entanto, de fato, uma parte dos adolescentes pode estar propensa a buscar álcool e outras drogas, fumar, fazer sexo sem camisinha, fazer amizade com pares que tendem a quebrar regras sociais e cometer delitos. Eles podem ter dificuldades em fazer amizades e frequentar a escola. Pais e mães são chamados pela direção da escola para conversar a respeito de suas notas que decaem diariamente e de problemas comportamentais que ocorrem naquele contexto com outros pares. Podem chorar todos os dias, parecer tristes e roer as unhas, sentirem apatia, dificuldades ou excesso de apetite, falta de prazer em viver. Podem também ter uma relação negativa com a família (responder de forma ríspida, agressiva) ou ficarem quietos demais (difícil ter um diálogo).

Muitos vivem dentro do quarto e do mundo virtual (videogames, redes sociais) e apresentam uma não colaboração com as responsabilidades da casa (não arrumam suas camas, deixam roupas pelo chão, não lavam louça, não ajudam com a limpeza da casa). Quando esses eventos ocorrem, muitas famílias sentem que foi criado um abismo de distância entre pais/mães e filhos(as), e nem sempre é claro como tudo chegou a esse ponto. Pode ocorrer uma sensação forte de impotência, desespero, não saber exatamente o que fazer. Nesses casos, uma orientação parental pode ajudar.
A orientação parental pode ajudar a restabelecer esse vínculo e a encontrar novas formas de se conectar com seu filho ou filha adolescente. Embora a maioria dos pais e mães sintam que não tenham protagonismo na vida deles, a presença desses genitores é de crucial importância para o desenvolvimento saudável dos filhos e para a longevidade dessa relação.
A pesquisa de Salvo (2010) apontou que pais e mães que sabem dialogar, expressar afetos e estabelecer limites de forma respeitosa podem ser fatores protetivos para que os filhos não se envolvam em comportamentos de risco, especialmente na fase inicial da adolescência (12-14 anos), e apresentem melhores comportamentos de saúde. Segundo Campos , Bolsoni-Silva, Zanini e Loureiro (2019), as práticas parentais positivas e mais habilidosas também podem ser responsáveis por uma relação mais íntima, próxima com filhos (as) com mais competências sociais. Além disso, o estudo de Antonelli-Ponti et al., (2021) indicou que o suporte emocional da família, dentre outros fatores, está fortemente relacionado ao melhor desempenho escolar em matemática, leitura e ciências, bem como à diminuição da ansiedade dos adolescentes no contexto escolar.
A adolescência é um período de transição que traz consigo desafios e descobertas únicas, tanto para os adolescentes quanto para os pais e mães. Estamos expostos a um contexto social, econômico e de relações interpessoais complexas, e a orientação parental desempenha um papel crucial durante esse momento, sendo fundamental para fortalecer os laços familiares. Apoiar o desenvolvimento saudável dos jovens junto a uma parentalidade mais consciente do que faz e do porquê faz pode auxiliar na longevidade dessa relação.
Muitos pais e mães se queixam que quando os (as) filhos (as) tornam-se adultos, somem, pouco os visitam, sentem-se abandonados. Via de regra, esse sumiço foi construído ao longo dos anos e sim, pode ser muito difícil admitir isso. Quando você pensa em sua mãe ou pai, hoje, na sua adultez, o que faz você procurá-los? Amor, alegria, saudade, gratidão ou obrigação (tentando honrar pai e mãe), como uma regra que foi aprendida? Que sentimentos você quer que seu (sua) filho (a) nutra por você, no presente e na adultez dele (a)?
O que posso esperar desta orientação parental?
A orientação parental na qual baseio meu trabalho tem os pressupostos da educação positiva e da terapia comportamental. Os objetivos são desenvolver um trabalho no qual pais e mães:
(a) possam reconhecer e lidar não apenas com as emoções de seus (suas) filhos (as), mas principalmente com as próprias emoões que surgem na relação;
(b) aprendam e/ou melhorem práticas que priorizem uma comunicação respeitosa e empática, tanto para ter uma conversa leve no dia a dia, expressar opiniões e desacordos, quanto para estabelecer limites;
(c) expressem sentimentos positivos e negativos de maneira habilidosa;
(d) trabalhem com a perspectiva de reconhecer comportamentos valorosos que os (as) filhos (as) já apresentam, não focando apenas nos comportamentos difíceis;
(e) auxiliem os (as) filhos (as) a desenvolver autonomia e fazer escolhas com responsabilidade;
(f) ajudem os (as) filhos (as) a desenvolverem habilidades sociais e emocionais para lidar com os diferentes contextos em que estão inseridos;
(g) criem um ambiente emocional seguro e acolhedor para que haja um terreno fértil para desenvolver uma relação com um vínculo amoroso forte e com resiliência, autoestima e autoconfiança para enfrentar as adversidades do mundo;
(h) promovam práticas de autocuidado para si mesmos.
Bons pais e mães também se permitem olhar para si mesmos, respeitar seus próprios limites, identificar suas dores e seus amores, ser autocompassivos consigo mesmos diante dos desafios da arte de educar.
Referências
Antonelli-Ponti, M., Monticelli, P. F., Versuti, F. M., Campos, J. R., & Elias, L. C. dos S. (2021). Academic achievement and the effects of the student’s learning context: A study on PISA data. Psico-USF, 26(1). https://doi.org/10.1590/1413-82712021260102
Campos, J. R., Bolsoni-Silva, A. T., Zanini, M. R. G. C., & Loureiro, S. R. (2019). Predictors of behavioral problems in adolescents: family, personal and demographic variables. Psico-USF, 24(2), 273-85. https://doi.org/10.1590/1413- 82712019240205
Salvo, C. G. (2010). Práticas educativas parentais e comportamentos de proteção e risco à saúde na adolescência. [Tese de doutorado, Universidade de São Paulo.
Commentaires